Vista como uma das principais fontes de aumento de arrecadação do Governo Federal para 2024, a Lei nº 14.789, publicada no Diário Oficial da União de 29 de dezembro, instituiu o novo regime de tratamento fiscal das subvenções para investimento, que passa a valer desde 1º de janeiro de 2024.
A nova norma revoga o artigo 30, da Lei nº 12.973/2014, além dos artigos 19, inc. V, e 38, § 2º, do Decreto-Lei nº 1.598/1977, que permitiam a exclusão das subvenções da determinação do lucro real tributado pelo IRPJ e do resultado ajustado tributado pela CSLL. Também revoga os dispositivos das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, que excluíam as subvenções para investimento da base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins, apuradas pelo regime não-cumulativo.
Segundo o novo marco legal:
- Ao invés de ser excluída do lucro real, a subvenção para investimento permitirá a apuração de um crédito fiscal de 25% do seu valor, que poderá ser utilizado na apuração do IRPJ, para compensação com outros tributos federais ou ressarcimento em dinheiro;
- Na apuração do crédito fiscal somente poderão ser computadas as receitas relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital, relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico, e desde que tenham sido tais receitas computadas nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL;
- O valor do crédito não será computado na base de cálculo do IRPJ, da CSLL, nem da contribuição ao PIS e da Cofins;
- Será considerada subvenção para investimento somente aquele benefício concedido para a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, conforme as seguintes definições:
- Implantação: o estabelecimento de empreendimento econômico para o desenvolvimento da atividade a ser explorada por pessoa jurídica não domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção;
- Expansão: a ampliação da capacidade, a modernização ou a diversificação do comércio ou da produção de bens ou serviços do empreendimento econômico, inclusive mediante o estabelecimento de outra unidade, pela pessoa jurídica domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção;
- Para que o crédito seja usufruído pelo contribuinte, será necessária a sua habilitação perante a Receita Federal, na qual se deve apresentar: (i) ato concessivo da subvenção, editado pelo ente federativo anteriormente à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; e (ii) ato concessivo da subvenção, que estabeleça expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas pela pessoa jurídica relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.
Além disso, a nova lei eliminou a possibilidade de a reserva de incentivo fiscal, formada a partir da contabilização das subvenções, ser computada na base de cálculo dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), cuja dedutibilidade segue regulada pelo artigo 9º, da Lei nº 9.249/1995.
Transação especial
Além das modificações acima, a Lei nº 14.789/2023 instituiu hipótese de transação tributária específica para débitos constituídos à luz do regime legal anterior a respeito das subvenções, reconhecendo que se tratava de assunto de disseminada controvérsia nos âmbitos administrativo e judicial.
Segundo a lei, a transação deverá ser proposta pelo Ministro da Fazenda, sob o regime das transações por adesão, podendo ser ofertados os seguintes benefícios aos contribuintes:
- Pagamento em espécie do valor da dívida consolidada, com redução de 80% (oitenta por cento), em até 12 (doze) parcelas mensais e sucessivas; ou
- Pagamento em espécie de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas, com a possibilidade de pagamento de eventual saldo remanescente:
- parcelado em até 60 (sessenta) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 50% (cinquenta por cento) do valor remanescente da dívida; ou
- parcelado em até 84 (oitenta e quatro) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 35% (trinta e cinco por cento) do valor remanescente da dívida.
A transação poderá ser utilizada para débitos inscritos ou não inscritos na Dívida Ativa da União, assim como para débitos ainda não lançados e que deverão ser objeto de autorregularização específica.
Contexto jurisprudencial
A título de recapitulação, recorde-se que a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, nos Embargos de Divergência nº 1.517.492-PR, afastou a incidência do IRPJ e da CSLL sobre créditos presumidos de ICMS, sob o fundamento de que a cobrança ensejaria violação ao pacto federativo.
Posteriormente, ao analisar o tema repetitivo nº 1.182, o mesmo STJ distinguiu o crédito presumido dos demais benefícios fiscais relativos ao ICMS, indicando que a não tributação destes pelo IRPJ e pela CSLL estaria sujeita ao atendimento das condições do artigo 30, da Lei nº 12.973/2014.
Há ainda dois julgamentos bastante aguardados a respeito da matéria, os quais poderão interferir diretamente nos rumos que o tema das subvenções para investimento deverá tomar, tanto para o passado, quanto para o futuro, a saber: o tema de repercussão geral nº 843, no Supremo Tribunal Federal; e os Recursos Especiais nº 2.091.208-RS, 2.091.200-RS e 2.091.206-RS, cuja afetação à sistemática de recursos repetitivos foi sugerida pela Ministra Assusete Magalhães, do STJ, em agosto de 2023, mas ainda não decidida pelo tribunal.
Expectativa de mais judicialização
Muito embora a Lei nº 14.789/2023 tenha o propósito de colocar uma pá de cal sobre o tema da não tributação das subvenções para investimento, inclusive abrindo a possibilidade de transação tributária para débitos passados, é de se esperar que a judicialização do tema persista.
E isto porque, como se pode ver da retrospectiva acima, ainda há uma grande indefinição dos próprios Tribunais Superiores acerca dos fundamentos jurídicos que permitiriam ou não excluir os benefícios fiscais relativos ao ICMS da incidência do IRPJ, da CSLL, da contribuição ao PIS e da Cofins.
Alguns temas parecem que continuarão controvertidos à luz do novo marco legal, incluindo a questão do pacto federativo, além da própria possibilidade de se considerar uma subvenção para investimento como receita e acréscimo patrimonial.
Veja-se que a nova lei parte da premissa de que somente existiria subvenção para investimento quando houvesse um ato concessivo próprio, individual e concreto, particularizando o benefício fiscal em relação a uma pessoa jurídica específica. Ignora, portanto, a possibilidade de o legislador estadual conceder um auxílio para investimento ou expansão em caráter setorial, o que ocorre em muitas situações.
Finalmente, note-se que, ao revogar o artigo 30, da Lei nº 12.789/2014, a nova norma eliminou qualquer referência ao tratamento tributário das doações feitas pelo Poder Público ao particular, o que podia ser comparável às subvenções para investimento, sob o ponto de vista de que ambas representariam meras transferências patrimoniais que não poderiam ser oneradas por aqueles tributos federais.
Como se pode ver, é de se esperar que as discussões se renovem, agora à luz da Lei nº 14.789/2023, ao menos até que a Suprema Corte possa trazer luzes mais nítidas com relação às discussões travadas no tema de repercussão geral nº 843.