Desoneração da folha

Outra medida enxergada como essencial para a arrecadação de 2024, por parte do Governo Federal, é a restrição ao regime de incidência da Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB), comumente referida como “desoneração da folha”.

No apagar das luzes de 2023, o Presidente da República editou a Medida Provisória nº 1.202, por meio da qual revogou os artigos 7º a 10, da Lei nº 12.546/2011, que regulavam a matéria, passando a dispor que:

  • A partir de 1º de abril de 2024, um número bem menor de setores de atividade econômica farão jus a um regime diferenciado de recolhimento da contribuição previdenciária sobre folha de salários, o qual observará as seguintes alíquotas: (i) para alguns: 10%, em 2024; 12,5%, em 2025; 15%, em 2026; e 17,5%, em 2027; e (ii) para outros: 15%, em 2024; 16,25%, em 2025; 17,5%, em 2026; e 18,75%, em 2027;
  • Essas alíquotas serão aplicadas sobre a folha de contribuição até o valor de um salário mínimo por segurado; sobre o que superar esse montante, será aplicada a alíquota geral (20%, em regra);
  • O novo regime será aplicável apenas às empresas que firmarem termo no qual se comprometam a manter, em seus quadros funcionais, quantitativos de empregados igual ou superior ao verificado em 1º de janeiro de cada ano calendário; e
  • Não respeitado esse compromisso, a empresa não poderá usufruir do regime durante todo o ano-calendário.

Cabe contextualizar que, um dia antes da MP, o Congresso Nacional, valendo-se do artigo 66, § 7º, da Constituição Federal, promulgou a Lei nº 14.784/2023, após ter rejeitado o veto total aposto pelo Presidente da República à prorrogação, até 31 de dezembro de 2027, da CPRB.

A nosso ver, a Medida Provisória é inconstitucional, pois desrespeitou o processo legislativo e a separação de Poderes, ao contrariar a derrubada dos vetos à Lei nº 14.784/2023.

Há jurisprudência muito clara a esse respeito por parte do Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado durante o Governo Federal anterior, o que se espera seja observado também na atual situação.

Além disso, é de se ver que a CPRB deveria ser mantida à luz da regra do artigo 30, da Emenda Constitucional nº 30/2019, que autorizou a continuidade das contribuições previdenciárias substitutivas incidentes sobre a receita bruta ou o faturamento, existentes até a data da promulgação daquela emenda.  Recuar com relação à adoção da contribuição substitutiva poderia ser visto, à ótica da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a respeito de temas similares, como um retrocesso social vedado pela Constituição.

Por fim, vale observar que, fazendo justiça ao histórico relativo à instituição da CPRB, ao menos o Poder Executivo federal previu a revogação, também a partir de 1º de abril de 2024, do adicional de 1% da Cofins-importação, que havia sido criado pela Lei nº 10.865/2004, dentre outros motivos, como uma forma de compensar a perda de arrecadação com a desoneração da folha.